Comecei a me sentir incoerente... então senti necessidade de por tudo o que estava dentro pra fora, pra olhar de longe e tentar entender como funciona...

sábado, 25 de janeiro de 2020

Sobre cantar em coro....

Hoje eu cantei a Missa de Alcaçus, no Fórum Coral, organizado pela Rede Cultural Luther King na Catedral da Sé.
E hoje, precisamente, finalmente, eu entendi porque gosto de cantar em coro, mais que de apenas cantar.
Eu cantei por algum tempo, parei, voltei, parei. E só hoje, no altar da Sé, me veio esse pensamento (em hora deveras imprópria, que foi preciso dizer xô, xô... volte mais tarde) sobre o que me atrai no canto coral.
Percebam:
O olhar vendo, atento no maestro; o ouvido escutando os sons das colegas ao lado, do conjunto e o meu próprio; a sensação do corpo concentrado - postura, respiração, articulação, que nada se faz ao acaso; a vibração do som na pele; a sensação da boca úmida, que garganta seca machuca. À exceção do olfato, cantar é o êxtase dos sentidos. É como dançar uma dança de movimentos minúsculos, sinto eu, ainda bailarina. Todos os seus sistemas receptores e produtores de informação estão concentrados num único ato e... Ah! Meus caros. É uma delícia.
É uma delícia pela mera sensação do canto, mas tem mais: num mundo de atenções tão constantemente divididas, estar cem por cento presente, por alguns minutos, num único lugar, é um descanso pra alma. Sabe a noite sem dormir? Não existe. A faxina por fazer? Não existe. As questões de família, de dinheiro, de trabalho? Nada existe.
Existe o seu corpo físico, a sua memória e a música. E só.
O maestro? Que me perdoem os maestros, mas vocês tampouco existem. Seus desejos, medos, anseios, humores e tudo o  mais que nos torna humanos estão em suspenso. De vocês existe apenas a mão, o olhar e a ponta da varinha. O maestro é a forma visível da música. E só.
A platéia? Que me perdoem os amigos que em anos antigos se dirigiram diligentemente às salas de concerto para me verem cantar. Eu não me importo. Ah! O inestimável desinteresse da arte! Eu canto unicamente para cantar.
Egoismo? Provavelmente.
Aconselho-vos a serem igualmente egoístas: venham unicamente para escutar.
E se em algum momento, lhes vier a vontade e a chance, vivam essa experiência única: Cantem!